Crítica: mesmo que “Esquadrão Suicida” não prometesse nada, ele ainda não entregaria



Esquadrão Suicida foi o segundo filme da DC em 2016. Com a promessa de ser algo divertido e surpreendente, David Ayer ficou com a missão de dirigir esse grupo de vilões que desafiavam as barreiras das narrativas sobre personagens desajustados. Sem meias palavras, vamos ser sinceros: ele não conseguiu.

O filme desponta como algo estranho logo nos primeiros minutos. A introdução é montada de cenas iniciais com Pistoleiro (Will Smith), Arlequina (Margot Robbie) e Amanda Waller (Viola Davis) em um diálogo com a audiência sobre os vilões. É só isso que nos separa da inserção do logotipo, o que é suficiente para nos deixar sem entender. Por que falaram somente sobre esses dois personagens do esquadrão? Se for servir de explicação, é porque o roteiro sequer liga para os outros membros.

Isso se acentua em uma montagem que pode parecer confusa, mas que na verdade conseguimos ler como amadora. Grande parte do primeiro ato do filme se assemelha a uma sequência de sketches, drops de curiosidade sobre os personagens que querem destacar, enquanto os outros caem no esquecimento antes mesmo de aparecer para o público - como é o caso de Amarra (Adam Beach). A verdade é que o roteiro não sabe o que fazer com eles porque o filme, no final, é sobre outra coisa.



Com isso, temos zero desenvolvimento em vários personagens. Katana (Karen Fukuhara) só serve para ser uma guarda-costa quase sem voz. Ela está ali como um token alegórico, soltando expressões em japonês que sequer são traduzidas porque, bem, a produção não se importa. Capitão Bumerangue (Jai Courtney) só é lembrado por nós devido ao seu sotaque irritante e forçado, enquanto Crocodilo (Adewale Akinnuoye-Agbaje) é a força bruta, os músculos que diminuem quando a continuidade esquece de deixá-los tão grandes quanto nas cenas de planos fechados. Ele ao menos serve de alívio cômico em momentos pontuais, mas nada espetacular.

Nem mesmo a vilã, Magia (Cara Delevigne), tem uma construção boa. A motivação da personagem é até palpável, mas somos negados a conhecer mais dela quando seu plano de destruição global não é explicado direito. Contudo, talvez assim tenha sido melhor, já que Cara como atriz é uma ótima modelo. Delevigne tem uma boa atuação corporal, mesmo que exagere às vezes, vamos dar isso a ela. Mas se até nesse aspecto a moça escorrega e cai em um overacting inegável, quando precisa interpretar o alter ego da bruxa, a doutora June Moone, ela não consegue fazer o mínimo. A atuação vocal de Magia só não foi mais prejudicada pela modelo por causa de um trabalho de edição de som bem feito.

Enquanto a equipe que dá nome à película vai sendo desfalcada pelo roteiro, o Coringa (Jared Leto) tenta criar uma sub-história para si. Essa ideia é interessante, mas funcionaria bem melhor se a presença do palhaço de Gotham fosse apenas sugerida durante todo o longa e se concretizasse no final. Ao invés disso, o Coringa dono de um stripclub acaba um pouco chato para o propósito do filme. A única coisa realmente boa que ele proporciona é mais tempo de tela para Margot Robbie.

Ao menos a decisão de praticamente ignorar o esquadrão nos permite ver mais do trabalho da atriz. Enquanto a concepção da Arlequina em si é bastante problemática (como a insistência em colocar a bunda da personagem em evidência, chegando ao ponto de ter ângulos que partem do meio das pernas dela), Robbie nos entrega muito bem as nuances entre loucura aleatória, "amor" fruto de um relacionamento abusivo e algumas gotas de tristeza, melancolia e noção de realidade. No mesmo barco que ela está Will Smith, que teve a sorte de pegar o personagem com um arco bem traçado. Dentre esses pontos bons, Viola Davis só brilha mais. No meio da bagunça que constitui esse filme blocado e genérico, ela consegue fazer de sua personagem o que ela é: a dona da porra toda.

É verdade que muitas vezes Amanda Waller vira uma mera narradora (porque, aparentemente, a audiênca é burra o bastante para não entender, mesmo depois de diversas cenas isoladas, que Arlequina é atraída pelo Coringa), mas mesmo nesses momentos Davis entrega com convicção e reforça a personalidade de sua personagem. Coisa, por exemplo, que Joel Kinnaman, que interpreta Rick Flag, faz de um jeito básico, sem emoção e apenas decorado.

Em meio à algumas cenas com a finalização de cutscene de video game, ainda sobra espaço para um CGI fraco que recai sobre o Incubus (Alain Chanoine), o irmão de Magia, e a transformação meta-humana de Diablo (Jay Hernandez). Esse último ainda é presenteado com mais uma carga negativa do roteiro que, no terceiro ato, quer nos fazer aceitar que a bagunça que vimos conseguiu criar uma noção de família/amizade entre os personagens. Exceto entre Arlequina e Pistoleiro, não há relação nenhuma sendo nutrida durante o longa, isso acontece somente na cena em que todos bebem em um bar. Talvez se não tivessem repetido a sequência de slash contra os capangas de Magia apenas cinco minutos após ela acontecer, poderíamos aceitar que o time começava a se tornar amigo.

Depois de pouco mais de duas horas e um monte de músicas boas utilizadas a torto e a direito, a única certeza que temos é que Esquadrão Suicida é um caos. E como todo caos, por mais confuso e desconexo que seja, há algo de belo que nos atrai. Contudo, essa beleza não dura o suficiente para se assentar e, pior, quer inovar, mas na verdade engana por pouquíssimo tempo. No final, somos deixados com um bando de luz neon que falha em iluminar qualquer coisa.


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